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Foto do escritorRubens Marchioni

■ Procura-se um…

Emprego. Empregabilidade. Trabalho. Trabalho em rede. Conectividade. Qual é o trabalho que a gente faz no emprego que tem? Patrão. Cliente. Formas de precificação e remuneração. O Facebook não me remunera pelo conteúdo que entrego todos os dias e por meio do qual ajudo a alimentar a mídia milionária. Mas, se escrevo livremente, por que ele deveria remunerar minhas ideias e textos? Fornecedor. Home Office. Mobilidade. Projeto. Empreendedorismo. A lista continua. Confusa como se pode notar, e isso nada tem a ver com qualquer descuido deste escriba. Tudo bem, o Word a colocaria em ordem alfabética, não mais do que isso. Mas a vida não se organiza segundo a lógica desse programa.

O que temos aí é a mais perfeita tradução do caos em que mergulhamos nesses tempos em que a vida se tornou digital, com seus desafios concretos, muito analógicos. Cabeça, tronco e membros, em nós, seguem funcionando e reagindo exatamente como era há séculos sem fim.

A Bíblia, lá pelas páginas do Antigo Testamento, fornece-nos uma imagem que bem pode ser tomada como a metáfora para descrever um pouco do que nos tornamos. Ela faz referência a um rei que teria cabeça de ouro e pés de barro. Isso mesmo. Fomos transformados em reis, senhores do mundo globalizado. Pensamos com critérios cibernéticos. Mas vivemos em casas normais. Alimentamos-nos com ingredientes produzidos a partir da terra. Locomovemos-nos com veículos movidos a partir de um combustível extraído de fósseis. Tudo comprado por meio de uma relação de troca em nada semelhante aos produtos que se vê no suntuoso edifício da Apple em Londres, onde bem se poderia cobrar ingresso para a visitação pública – eu teria pago. Dissonância completa, portanto.

Se for verdade que a lista continua, a discussão também ganha novos espaços. Confusos. Por todos os cantos, especialistas procuram lançar uma nova luz sobre cada conceito que nos parecem familiares demais e, no entanto, fogem à nossa compreensão. Está cada vez mais claro que não temos tanta clareza a respeito de todo esse emaranhado caótico em que se transformou a tarefa de produzir e vender bens e serviços. Coisas da sisuda Tecnologia da Informação? Resultado da globalização impiedosa? [E você acredita que se soubesse a resposta para todas essas perguntas eu estaria aqui]?

A questão continua sendo de que maneira conseguir trabalho. Até onde se sabe, na busca por uma nova colocação, os especialistas recomendam que o Curriculum Vitae, atualizado com frequência, seja cadastrado no site das empresas desejadas. A propósito, convém notar que em tempos de novas linguagens, o nome desse relatório continua grafado em Latim, idioma que sobrevive a duras penas no interior do Vaticano. Segundo esses profissionais, nada é mais anacrônico do que enviá-lo por via postal, ainda que impresso em papel da melhor qualidade. A caixa do correio deve ser substituída pelo ícone Trabalhe Conosco. O que, de resto, requer um instrumento, o computador com internet e uma habilidade, a de manusear e administrar tudo isso de maneira eficiente.

Nesses tempos, em que a maioria das pessoas implora por textos telegráficos, quando se trata de se apresentar para um futuro empregador, a regra é não ter medo de texto longo. Segundo as novas regras, sai na frente quem detalha tudo o que fez no âmbito profissional. Aqui, interrompo o assunto e pergunto: “E quanto àquela conversa, segundo a qual nenhum currículo deve ter mais de duas páginas?”

Nos anos 1980 Drayton Bird publicou o excelente Bom senso em marketing direto, lançado no Brasil pela Makron Books. Na obra, o autor encerra com inteligência a discussão improdutiva sobre a extensão da mensagem. “De quanto barbante você precisa para amarrar o seu pacote?”, questiona. Para ele, es-te é o critério decisivo. Teria o assunto, no caso do Currículum, dado lugar à proposta do especialista?

E um último lembrete nos leva para o campo das mídias sociais. Cuidado com elas. Muito cuidado. As empresas costumam dar uma passadinha por lá, com tempo, disposição e lentes bem afiadas, à procura de algum deslize cometido pelo candidato a uma vaga. Aquele seu desabafo, o problema que tentou resolver por meio delas, tudo o que fez livremente pode agora ser usado contra você, quando sondado para ocupar aquele cargo que espera por alguém à altura. O mesmo vale para a postagem que comentou, compartilhou, ou deu uma simples e inocente curtida. Não se trata de censura prévia, mas eles gostam muito de saber o que o futuro profissional anda pensando. Pense nisso.

A exigência de precauções parece óbvia demais? Sim. Convém lembrar que descuidos irreparáveis acontecem com uma frequência maior do que se imagina. Por exemplo, conta-se o caso, segundo o qual um funcionário sentiu-se à vontade para fazer uma pequena avaliação do seu superior nas redes sociais. Segundo a lenda, ele entrou para a história da empresa como “Fulano de Tal, O Breve.” Graças à justa causa, imediata e irrevogável, o descuidado transformou-se em procurador do estado. Diz a anedota que a partir de então, lá estava ele, todos os dias, mergulhado no caderno de empregos do Estadão, à procura de um novo espaço profissional.

Então, boa sorte a todos nós. E que Deus, lá no céu, reedite o Pentecostes. Se possível em caráter de urgência. Amém. ₪

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