Naquela grande cidade, entrei em uma rua, escolhida sem critérios, diante de tantas que podia seguir. Por todos os lados, os trabalhadores braçais se mostravam muito ocupados.
Usavam grandes marretas e equipamentos hidráulicos. Usavam toda a força que podiam encontrar em seus braços e pernas. Nada poderia resistir às suas investidas violentas e cheias de determinação. Nada ficaria em pé.
Com fúria e certo prazer velado, deitavam, uma a uma, as paredes no chão. Paredes centenárias. Todas construídas com pouco tijolo e grande quantidade de madeira. Madeira de lei. Exclusivas e com pedigree. Tudo muito bem conservado. Inclusive a pintura com a qual se revestiam para percorrer uma história feita de séculos. Indestrutíveis.
Deixei aquela rua para me livrar da sua monotonia composta pelo grande número de casas tombadas, abatidas por esse exército faminto de demolidores. Tempo perdido. Outros casarões ruíam à minha frente. Naquela cidade e em tantas outras. Um cenário inacreditável, desses que fariam com que Spielberg se sentisse um estagiário da sétima arte.
Foi então que um facho de luz inundou o meu entendimento. Finalmente, compreendi de onde sai tanta madeira de demolição com que marcenarias produzem todo o mobiliário suficiente para abastecer o mercado. Móveis exclusivos. Sempre exclusivos.
Ao mesmo tempo, outra interrogação foi removida da minha cabeça preconceituosa e desinformada. Refiro-me ao fato de que a cidade de Gramado, no Rio Grande do Sul, tem a extensão equivalente à de São Paulo, Capital. Exceto a igreja, uma pequena escola, um posto bancário e um pronto socorro, tudo tem seus dias, espaços e mão de obra ocupados pela produção de móveis. Todos feitos com madeira da melhor procedência. Que também pode ser de demolição, por que não?
Muito bem, deixemos que os operários, vorazes, derrubem os milhares de casarões que puderem encontrar, e que Gramado não repouse da sua tarefa de produzir móveis. Afinal, os vendedores precisam continuar acreditando nessa verdade que um dia compraram e, agora, desejam dividir comigo a qualquer preço. ₪
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