■ As muitas faces da generosidade
- Rubens Marchioni
- 18 de fev. de 2019
- 4 min de leitura
VOCÊ CONHECE ALGUÉM que não deseje encontrar generosidade pelos caminhos onde passa? Do santo ao bandido incorrigível, todos querem provar algumas gotas desse mel indispensável à vida. Um desejo que é uma ordem. Cumpra-se.
Antes da dimensão do amor, que vem depois, a prática da generosidade é ferrenha defensora da justiça. Ela não pede nada que não lhe pertença por direito. Sua matemática é precisa: na operação que soma dois mais dois, o resultado é igual a quatro. O resto é acréscimo, fica para depois. A regra é bastante clara, não cabe revisão.
Para que o projeto deixe o papel e se converta em prática, pode ser o caso de contar com a ajuda de recursos exteriores. Que entre, portanto, a criatividade, expressa no bom humor, com suas luzes reveladoras. Gente sisuda, séria além da conta, não consegue criar, pensar o novo. Mas, como fugir, se a generosidade pede exatamente isso? Porque em geral ela deseja encontrar soluções para problemas aparentemente insolúveis. E através do humor será possível buscar novos ângulos, fazer novas releituras e chegar à segunda resposta certa. Criar é uma palavra que rima com revisar. Revisar conceitos. Mudar, para que ambientes e relacionamentos mudem.
Para que serve, afinal, a generosidade? Para o serviço. A resposta pede apenas uma palavra, e ela está nesse texto para servir ao leitor em busca de entendimento. Os recursos para atender às necessidades de cada um, estes sim devem ser usados de maneira diferente, sempre que isso se justificar, em função dos resultados pretendidos. Isso se aplica em todos os contextos: o doméstico, o escolar, o empresarial, o eclesiástico, o governamental e vai por aí afora. Nada parece mais democrático, portanto, quando o projeto de vida pede mudança para a sociedade mergulhada num vale-tudo que não pode continuar.
Por outro lado, olhando do ponto de vista prático, a generosidade encurta caminhos. Reduz o tempo empregado em tarefas corriqueiras. Gera economia de mão de obra e de saúde física e mental. Para ficarmos no campo corporativo, a carreira profissional sabe muito bem como isso funciona. Pessoas generosas tendem a cativar. Tornam-se líderes, sem precisar de decretos ou fazer qualquer esforço adicional para se colocarem à frente do grupo, que se dispõe a segui-las.
Talvez esta filosofia, que inclui pensar no outro como prioridade, pareça algo frágil, talvez simplória. Não é. Sua força descomunal fratura mortalmente as barreiras que impedem mudanças. Diante dos obstáculos, ela não se intimida. Porque sabe muito bem a força de que dispõe. Sem meios para resistir, eles sucumbem à prática silenciosa desse furacão que avança enquanto varre antigos paradigmas. O que não significa, no entanto, que a sua sobrevivência acontece por mágica. Ela requer persistência, porque em alguns momentos as dificuldades podem parecer grandes além do que pode ser suportado.
Ao mesmo tempo, a prática da generosidade se torna ingênua e inviável sem outra, anterior: ver, julgar, agir. Ver, observar o contexto. Analisar o desempenho de fatores como o poder, a política, a economia, a ideologia, o marketing, a busca por valores e autotranscendência. Por fim, agir de maneira coordenada e harmônica, por meio de diferentes competências, para que a melodia não desafine e o sucesso da empreitada esteja garantido.
A propósito disso, convém lembrar que, na prática da generosidade, a guerra é vencida por quem consegue ser e fazer mais pelo outro. Entregar mais. Porque aqui, menos é menos. Ao mesmo tempo, quando o assunto é atingir metas, o trabalho fica ainda mais fácil. Compreende-se: num clima em que o resultado coletivo conta mais do que a vitória individual, o apoio oferecido a cada novo trabalho se torna prática habitual. Inclusive porque os envolvidos tendem a ser os primeiros beneficiados com isso. Resquícios de ideias limitadoras, ideologias arcaicas? Por estar acima desses critérios, a generosidade sabe muito bem como reunir e queimar tudo isso. Ela domina com virtuosidade os instrumentos da renovação.
Tudo, no entanto, requer engajamento. Aprender mais sobre cada etapa do processo. Saber, saber fazer, querer fazer. Atleta despreparado não conquista medalhas. E pode desclassificar o time, eliminando-o do campeonato. Como se sabe, no estádio do mercado, o jogo é implacável. É preciso ter bagagem para não dar bola fora. Mais do que isso, há que se aproveitar cada oportunidade de servir. Buscar espaços e situações que demonstram maior carência de apoio e deixar aí a sua marca transformadora. ‘Esta é o que considero a verdadeira generosidade. Você dá tudo de si, e ainda sente como se não lhe tivesse custado nada’, reflete Simone de Beauvoir.
Generosidade é serviço, e isso requer um clima de confiança – ‘quando a esmola é demais, o santo desconfia’, rezam as pessoas mais simples diante de promessas que não entendem. Eis por que a transparência se mostra um elemento essencial. A generosidade não aceita engano e confusão, sobretudo em ambientes em que abundância dessas práticas minou qualquer possibilidade de acreditar até mesmo em evidências.
Convém lembrar, também, que pessoas generosas são comunicadoras por excelência. Primeiro, quando anunciam o que desejam ou se prontificam a fazer. Depois, quando a palavra se torna instrumento que sustenta e viabiliza as ações previstas. Comunicar com clareza é sinal de elegância e respeito. Um jeito bonito, simpático, glamouroso de servir. Só quem domina a forma e dispõe de conteúdo, isto é, de repertório, pode fazer isso com a arte e adequação que o momento exige.
Além de tudo, a prática da generosidade possibilita a implementação de soluções com mais rapidez e eficiência. Resultado: vivenciar o momento de descanso se torna mais saboroso, porque além de tudo ele se mostra restaurador. O travesseiro que o diga.
No final das contas, uma conclusão salta aos olhos: usar de generosidade com o outro é uma atitude inteligente, no mínimo pelos benefícios que isso traz a quem adota essa renovadora filosofia de vida. ₪
RUBENS MARCHIONI é palestrante, redator publicitário, jornalista e escritor. Autor de Criatividade e redação, A conquista e Escrita criativa. Da ideia ao texto. rumarchioni@yahoo.com.br – http://rubensmarchioni.wordpress.com
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